terça-feira, 8 de dezembro de 2015

A Emancipação de Aparecida e a Imprensa Local

A imprensa escrita teve papel destacado no processo de emancipação da cidade de Aparecida na década de 1920, como instrumento para esclarecer a opinião pública acerca da necessidade de autonomia frente aos problemas e desafios trazidos pelo contínuo descaso político da edilidade guaratinguetaense. Como, também, para derrubar teses inverossímeis apregoadas pelo partido político situacional sobre a inviabilidade jurídica do desmembramento do território. E para dar maior ênfase e encorajar a população na luta pela causa, presente desde o final do século XIX.
Justamente no período de crises e mudanças políticas por todo o país, com certo comprometimento de determinadas classes sociais que lutavam por seus direitos de liberdade e atuação nos destinos das cidades. Antecipando a derrocada quase completa das oligarquias regionais paulistas representadas por famílias, cujo domínio político baseava-se na tutela do indivíduo, instituída na forma do jogo de favores, no voto de cabresto e no acesso aos empregos públicos por militantes e correligionários leais. A época dos coronéis e da indistinção do público e privado na gerência dos negócios do executivo e do legislativo. Como da política de alianças realizadas em nível partidário e eleitoral para a escolha dos candidatos. Período do voto aberto, das fraudes e dos eleitores escolhidos de forma censitária.
Em Guaratinguetá, por esse tempo e dentro desse quadro, a atuação da imprensa não era indiferente a tal situação e estava calcada principalmente no jogo político. Existiam diversos jornais e informativos, e dentre eles “O Correio Popular”, sob a direção do Partido Republicano Paulista (PRP) e os jornais “O Pharol” e “A Liberdade”, de cunho oposicionista. O primeiro sob o julgo da família Rodrigues Alves, conhecido como partido alvista; e os dois últimos sob a orientação da família Camargo (partido camarguista). Os alvistas eram contrários e os camarguistas a favor da emancipação de Aparecida.
E foi através deles que foram travados os principais argumentos e contra-argumentos sobre a emancipação do município de Aparecida, cujo ápice dá-se entre os anos de 1924 e 1928, finalizados com a vitória em 17 de dezembro de 1928. Principalmente nos editoriais de ambos os jornais. “A Liberdade”, criado para o fim exclusivo de lutar pelo status de município e combater a campanha contrária do PRP. E o “Correio Popular”, em circulação anos antes, para servir de veículo de catecismo crítico a impedir o movimento de fragmentação do território guaratinguetaense. Sem excluir, que independente, existiram discussões, brigas e desentendimentos no seio da população. Entre pessoas comuns, residentes em Guaratinguetá e Aparecida, conhecidos pejorativamente como trancas e gamelas.
“A Liberdade”, circulante em primeiro número a 16 de março de 1924, sob a direção de Júlio Machado Braga (diretor) e Irineu de Carvalho (gerente), procurou, ao longo do tempo, rebater as justificativas emitidas pelo “Correio Popular”, que defendia ser impróprio e impossível pensar em desmembramento do território, pois o bairro ou freguesia de Aparecida não possuía qualificativos jurídicos para almejar tal liberdade. Não possuía número suficiente de habitantes (10.000) e que sua ligação com Guaratinguetá era feita apenas por uma avenida, por distância abaixo dos seis quilômetros previstos em lei; e que assim independente ficaria com território minúsculo, e sem casa apropriada para abrigar a Câmara Municipal.  
Para o olhar dos signatários do “A Liberdade” as teses do rival eram inadmissíveis por não corresponder com a realidade. Defendiam, em suas páginas, diante de uma nova e promissora conjuntura política, e embasada na ideia de direito e liberdade iluminista, a possibilidade e a necessidade de ser uma cidade com recursos próprios aplicáveis em benefício do seu crescimento, enquanto uma localidade de fundamental importância no cenário nacional e internacional, por ser Santuário de Nossa Senhora Aparecida e sede de uma basílica menor. Contando com apoios políticos importantes, como o de Washington Luís, recém-eleito e empossado para o governo do Estado; da maior parte da Câmara dos Deputados Estaduais e de uma renovada liderança jovem, sob a batuta do Doutor João Batista Rangel de Camargo, ocupante de uma cadeira na mesma casa de leis. Sobretudo da população, ativa participante das subscrições levadas a efeito, requerendo urgência para a questão em causa.
Os oposicionistas revidavam nas páginas e nos editoriais do “Correio Popular”, com circunlóquio verbal extremamente pobre e apelativo, acusando de traição todos os favoráveis ao processo. Mas diante dos fatos reais, nada puderam fazer, pois era evidente a situação de descaso de Guaratinguetá. Falta intensiva de água, aparência urbana decadente nos logradouros e praças no entorno da Basílica, e notadamente os altos impostos municipais cobrados da população, a cada ano crescente, sem retorno em benefícios de infraestrutura. 
Venceu a “Causa Santa”, como designou o articulista do jornal “A Liberdade”, que quebrou uma situação que perdurava desde fins do século XVIII. Pois as melhores terras e a maior parte da renda de Guaratinguetá estavam e vinham do seu antigo bairro.
E, mesmo assim, o oposicionista jornal “Correio Popular”, doravante, na década de 1930, transposto para “Correio Paulista”, continuou a existir servindo uma elite social e política da cidade, muita embora com outras características.
Sem perda de tempo, esses mesmos opositores, vendo a causa própria perdida, usaram o recurso de adesistas de última hora, defendendo a causa no último momento, ao dar entrada ilicitamente no pedido de emancipação na Assembleia Legislativa de São Paulo, através do oficialismo do Partido Republicano Paulista.

Referências
Hemeroteca do Museu Frei Galvão - Arquivo Memória de Guaratinguetá.

sábado, 21 de março de 2015

Fazenda Conceição - Bairro do Ronco – Lorena-SP


A fazenda Conceição (segunda metade do século XIX), ou fazenda Barreiro (século XX), localizada no antigo bairro do Ronco (próximo a outro - Campinho – segundo os documentos) teve diversos proprietários no decorrer de sua existência e sua origem está preteritamente ligada a ocupação das terras da região no século XVIII, na margem esquerda do Rio Paraíba, com o sertão dirigindo-se para a Serra da Mantiqueira, para o Embaú (Cruzeiro), na rota conhecida como “Estrada Real”, e é um dos exemplos, dentre vários, para o estudo da história do Vale do Paraíba, pela possibilidade de compreensão do processo de ocupação e utilização de uma área econômico-agrária estritamente ligada ao caminho das Minas Gerais.
Regredindo a partir do Coronel Vicente Barreiro, proprietário da fazenda nos primeiros anos do século XX, o levantamento histórico e documental tem demonstrado que suas terras e benfeitorias ficaram nas mãos de famílias de um mesmo tronco familiar. Por intermédio de heranças, transações imobiliárias (entre herdeiros), e compra de pequenos sítios e porções de terras[i] vizinhas, comum no período anterior à crise do café e à abolição, com o objetivo de preservar a riqueza[ii].
Toda a região do entorno da fazenda foi posse das famílias Gomes Sandim e Pereira de Castro-Domingues Salgueiro, que posteriormente ligaram-se aos Azevedo, Moreira Lima, ao Visconde de Guaratinguetá e outras famílias, também senhores daquelas terras, até o final do século XIX, quando é vendida após passar por hipotecas oriundas das crises do café e da mão de obra.
O Coronel Vicente Barreiro, proprietário que adquiriu a fazenda entre 1901 e 1905, obteve-a pela compra de duas partes distintas, tornando-a apenas uma fazenda, com o nome de Fazenda do Barreio[iii].
A primeira foi adquirida de James Pellew Nelson (1847-1931), inglês estabelecido no Rio de Janeiro, pertencente a uma rica família de empresários, com diversos negócios no Brasil[iv]. A segunda foi adquirida de Bernardo José de Souza Carvalho Brandão, comerciante estabelecido no Rio de Janeiro, em 1894, que por sua vez adquiriu em 1888, do Coronel Bráulio Moreira de Castro Lima[v]. Entre esses anos, esteve arrendada, por quatro anos, para Egídio Soares Louzada, residente em Piquete, em data de 28/12/1888 (Arquivo Histórico de Lorena – Livro de Escrituras nº 66, Fls. 51, nº 5286) [vi].
James Pellew Nelson adquiriu a fazenda por compra que fez a João Carlos Nogueira de Sá[vii], morador de Lorena, que foi proprietário dela por mais dez anos, período em que os cafezais da mesma foram objetos de penhor agrícola, na faixa de 2.000 a 4.000 arrobas, para a firma Macedo Sobrinho Abreo e Quartim (1887, 1888 e 1890), do Rio de Janeiro[viii](Arquivo Histórico de Lorena – Livros de Escrituras), como também de escritura de hipoteca[ix]no mesmo dia em que foi adquirida do Major Antônio Martiniano de Oliveira Borges, em 29/07/1879 (Escrituras do Cartório do 1º Ofício de Guaratinguetá -Lº 30 – Fls. 164), pela quantia de 130:000$000 (juntamente com mais 39 escravos), a 6% de juros ao ano, por um período de oito anos, sendo que 70:000$000 pela compra do imóvel e 60:000$000 por empréstimo em dinheiro[x]. Foi também hipotecada, respectivamente, em 02/05/1890 e 19/07/1894 para o Banco da Lavoura do Comércio do Brasil, com sede no Rio de Janeiro (Cartório de Registro de Imóveis de Lorena - Livro de Inscrição Especial de Hipotecas).
A compra da fazenda de cultura, onde aparece pela primeira vez com o nome de Conceição, foi realizada por 150:000$000 (valor declarado em escritura), juntamente com os 39 escravos, e incluía ainda: terras, paióis, senzalas, cafezais e casas de morada, esta talvez a mesma existente nos dias atuais e que, por hipótese, deve ter sido construída pelo major ou pelos dois antecessores imediatos, o Visconde de Guaratinguetá, o Major Manuel da Silva Leme ou o Padre Manuel Teotônio de Castro[xi].
O Major Antônio Martiniano de Oliveira Borges, filho do Visconde de Guaratinguetá e de sua primeira mulher, Ana Silvéria Umbelina do Espírito Santo (Baronesa de Guaratinguetá) obteve a fazenda e as terras em duas partes distintas: a primeira por doação, em legítima de sua esposa, Ana Maria da Silva Leme (ou Ana Maria de Oliveira Borges), no inventário do sogro, Major Manuel da Silva Leme, fazendeiro em Areias, em 1875 (MOURA, 2002:166 e 203), por motivo da clausula imposta pelo Visconde de Guaratinguetá ao vender as terras para o referido major (adiante). E a segunda, por compra que fez do irmão, Francisco de Paula Oliveira Borges[xii], político influente no Rio de Janeiro, casado com duas das filhas do Marques de São Vicente.
Por sua vez, o Major Manuel da Silva Leme adquiriu, por compra, em 20/02/1869 (Arquivo Histórico de Lorena – Lº de Escrituras de Lorena nº 42-44 – fls. 138 v), do Visconde de Guaratinguetá, sem a denominação encontrada posteriormente, apenas designada genericamente como a fazenda que foi do Padre Manuel Teotônio de Castro, no bairro do Ronco. O titular fez venda condicionada, exigindo que a mesma fosse dada ao genro, filho do Visconde, por conta da herança que receberia do sogro[xiii]. A fazenda ficou na posse do Major Manuel da Silva Leme por quase seis anos, o que faz pensar que na verdade quem cuidava das terras era o próprio genro e, portanto, a intenção do Visconde parece ter sido privilegiar o filho, evitando desmembramentos consequentes da sua morte, como também a do Major, que tinha outros filhos.
O Visconde de Guaratinguetá adquiriu a fazenda em 22/02/1856 (Arquivo Histórico de Lorena – Lº de Escrituras – nº 27-28 – Fls. 142) do Padre Manuel Teotônio de Castro, que era vizinha de outra propriedade sua, obtida por herança de sua sogra, Dona Silvéria Inocência de Gusmão, casada com o Capitão Francisco Gomes Sandim (pais da baronesa) e que estavam anexadas quando foram vendidas, em 1869, ao Major Manuel da Silva Leme; um sítio e terras descritos e avaliados no inventário da primeira esposa, Ana Silvéria Umbelina do Espírito Santo (mãe do Major Martiniano) ocorrido em Guaratinguetá em 1856 (Museu Frei Galvão/Arquivo Memória de Guaratinguetá - Inventários do 1º Ofício de Guaratinguetá):

“A fazenda comprada ao Reverendo Manuel Teotônio de Castro, constando de Terras, Caffezais, Engenhos de Canna e de socar Caffe, Estufa, Moinho, Roda de Mandioca, Monjollos, Trastes de Casa, Cobres assentados, Plantações e todas as mais benfeitorias comprehendendo nesta Fazenda tão somente das Terras que forão de Dona Silvéria e parte que ele ante possuidor comprou a Dona Maria Pereira da Guia de Azevedo, cujo o rumo será levado até onde findar o Certão das Terras que forão de ditta Dona Silvéria ... 22:000$000” - “A fazenda que foi de Dona Silvéria, e seos herdeiros, comprehendendo Terras, Cazas de morada, Engenho de Canna, e todas as mais benfeitorias.... 8:000$000” (fls. 132v.).

e que foram partilhados da seguinte forma: a fazenda que pertenceu ao padre[xiv], Dr. José Martiniano de Oliveira Borges (4:456$000 – fls. 244v.); Alferes Joaquim José da Silva Leme (1:168$000 – fls. 257), Inácio Joaquim Monteiro (2:729$333 – fls. 262); Francisco de Assis Oliveira Borges (2:729$333 – fls. 265); Rafael de Assis Oliveira Borges (2:729$333 – fls. 267v.); Francisco de Paula Oliveira Borges (2:729$333 – fls. 270v.); Dr. Joaquim de Assis e Oliveira Borges (2:729$333 – fls. 272v.); Dona Maria da Ressurreição (2:729$335 – fls. 276); as terras do sítio que foi de Dona Silvéria Inocência[xv]: Inácio Joaquim Monteiro (2:000$000 – fls. 262); Rafael de Assis Oliveira Borges (2:000$000 – fls. 267v.); Francisco de Paula Oliveira Borges (2:000$000 – fls. 270v.); Dr. Joaquim de Assis e Oliveira Borges (2:000$000 – fls. 272v.).
Foi justamente a parte que coube a Francisco de Paula Oliveira Borges que o Major Antônio Martiniano de Oliveira comprou, declarando-a quando fez a venda a João Carlos Nogueira de Sá em 1879 como fruto da herança materna.
No Registro Paroquial de Terras de 1856[xvi], da vila de Lorena, o Visconde de Guaratinguetá faz declaração das terras e do sítio, confirmando as informações sobre os seus bens de raiz[xvii], com os confrontantes e origem. Como também as terras o Padre Manuel Teotônio[xviii], Dona Maria Pereira da Guia e Azevedo[xix]e outros.
Por sua vez, a terra de Silvéria Inocência de Gusmão é provável ter origem também por dupla mão: herança e compra. A primeira por morte do marido, Capitão Francisco Gomes Sandim, ocorrida em 1825 (Arquivo Histórico de Lorena), e a segunda adquirida pela própria do Capitão João de Moura Fialho e de Rodrigo Antônio de Oliveira Leite, ambos de Guaratinguetá[xx]. Portanto, numa primeira impressão, parece que parte das terras vem da família Gomes Sandim, com inicio de ocupação na primeira metade do século XVIII, assim como parte das terras que vieram do Capitão Mor Manuel Pereira de Castro, como adiante se verá.
O Padre Manuel Teotônio de Castro, filho do Capitão Mor Manuel Pereira de Castro e de sua mulher Dona Ana Maria de São José, foi proprietário da referida fazenda e terras por intermédio de compra e herança[xxi]. A compra fez de sua irmã, Dona Maria Pereira da Guia e Azevedo, em 11/07/1852, pelo preço de R$ 200$000 (Arquivo Histórico de Lorena – Livro de Escritura nº25-26 – fls. 238 v.):

“um pedasso de terras [...] que houve por Erança do finado seo pai Capitaõ Manoel Pereira de Castro e que foraõ da finada Antonia Gomes Sandim [...]” dividindo com o comprador e com o Visconde de Guaratinguetá.

Por outro lado, herdou parte das terras e da fazenda no inventário de seu pai, Capitão Mor Manuel Pereira de Castro, realizado em 1846 em Lorena (Arquivo Histórico de Lorena): Em parte de quarto e meio de terras na sobrequadra[xxii]da Fazenda, com 912 braças de testada, onde ele herdeiro tem suas benfeitorias, dividindo com João Batista de Azevedo, no valor de 1:550$000[xxiii].
Maria Pereira da Guia Azevedo recebeu as terras compradas de Antônia Gomes Sandim no inventário amigável da mãe[xxiv], Dona Ana Maria de São José, em 1848 (Arquivo Histórico de Lorena): uma parte de terras pegadas as da fazenda, no valor de 1:000$000. Por sua vez, sua mãe a obteve no inventário do marido, o referido capitão mor.
O padre também herdou outra parte de terras no inventário da mãe: 200 braças de terras da fazenda, atravessada na sobrequadra, pegadas as terras que já pertencem a ele herdeiro, no valor de 398$000[xxv].
Assim, parte da fazenda do Visconde de Guaratinguetá, vendida ao Major Manuel da Silva Leme, estava em mãos do Capitão mor Manuel Pereira de Castro no segundo quartel do século XIX, além de outras descritas em inventário.
Outra parte, o mesmo capitão comprou, por 153$600, de Antônia Gomes Sandim[xxvi], em 06/09/1828, por escritura pública (anexa ao processo de medição judicial das terras de Maria da Guia – fls. 20). Segundo sua própria declaração, no referido processo, recebeu em herança dos pais, Manuel Gomes Sandim (português) e Maria do Rego Barbosa: “[...] huma porção de terras indivisas no Citio do Campinho Termo desta Villa [...]”.
Bem como, outra parte, também adquirida por compra pelo capitão mor, por escritura particular, em 16/02/1813, de Francisco Lopes Vieira e de sua mulher Ana Francisca (transcrita no processo de demarcação judicial – fls. 37), na paragem denominada Ronco, pelo preço de 136$000, com a seguinte descrição: 200 braças de testada[xxvii]no córrego do Monjolo, partindo com terras de Francisco Gomes Sandim e o sertão com Ângelo Rodrigues e pela testada com o Capitão Manuel Pereira de Castro, com casas cobertas de capim, paredes de mão, sem portas, uma cozinha, monjolo e roça de milho.
Pelo que se vê o Capitão mor, no período da compra já possuía outras terras na localidade, o que leva crer que seja a sesmaria que recebeu (Repertório de Sesmarias, p. 241) ou a alguma compra realizada pelo mesmo.
E ainda, as terras, em parte, parecem remeter também para a sesmaria de Antônio Domingues Pereira (Repertório de Sesmarias, p. 44-45), bisavô de Dona Maria Pereira da Guia Azevedo e do padre, portanto, avó de Antônio Domingues Salgueiro, seu primeiro marido, e ainda, por intermédio do Tenente Francisco Gomes Sandim (herança ou não), neto do mesmo Antônio Domingues. O mesmo Francisco Gomes recebeu sesmaria em 26/01/1785 (MOURA, 2002:284).
Além de tudo isso, pode-se chegar, também, a duas outras antigas sesmarias de Lorena, no século XVIII, que pertenceram a Domingos Bicudo Leme, casado com Clara Parente de Camargo, antepassados da família Pereira de Castro.

REFERÊNCIAS

Fontes Primárias
Arquivo Público do Estado. Tombamento dos Bens Rústicos – 1817.
Museu Frei Galvão/Arquivo Memória de Guaratinguetá. Livros de Distribuição de Escrituras – 1860-1870.
Cartórios do 1º e 2º Ofício de Guaratinguetá. Escritura de Compra e Venda – Francisco de Paula de Oliveira Borges.
Casa da Cultura de Areias. Inventário do Major Manuel da Silva Leme – 1875.

Obras Impressas
ARQUIVO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO. Repertório de Sesmarias. São Paulo: Secretaria de Estado da Cultura, 1986.
MOURA, Carlos Eugênio Marcondes de. O Visconde de Guaratinguetá: Um Fazendeiro de Café no Vale do Paraíba. São Paulo: Studio Nobel, 2002.
QUEIROZ, Carlota Pereira de. Vida e Morte de um Capitão Mor. São Paulo: Conselho Estadual da Cultura, 1969.
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[i] Lucila Herrmann discorre sobre a questão da anexação para Guaratinguetá, com maior intensidade, no segundo quartel do século XIX, mas o processo é anterior e a fazenda Conceição é um exemplo típico, formada a partir dessa modalidade já no inicio do século XVIII, a partir da doação de sesmarias, onde o contemplado obtia grande porção de terras.
[ii] Tomando como ponto de partida o século XVIII, período inicial da ocupação das terras da fazenda e de seu entorno, vê-se que alguns herdeiros também se estabeleceram em terras próprias a partir do núcleo inicial, constituindo fazendas distintas, a partir do segundo quartel do século XIX, graças a um ou mais indivíduos que acumularam patrimônio agrário num período anterior, como os casos da Fazenda do Campo, pertencente a Dona Maria da Guia Pereira e Azevedo (herança dos pais) , da Fazenda do Bonito, do Padre Manuel Teotônio de Castro, da fazenda do Capitão Domiciano Ferreira da Encarnação (no Embaú) , e das terras de Dona Silvéria Inocência de Gusmão, casada com o Capitão Francisco Gomes Sandim (depois com o Visconde de Guaratinguetá), todas limítrofes da fazenda.
[iii] Numa primeira análise é possível afirmar que as duas glebas tenham origem comum. A ideia é verossímil na medida em que uma delas veio da família Moreira Lima, entrelaçada com a família do Capitão Mor Manuel Pereira de Castro.
[iv] Juntamente com os irmãos Alexander Pellew Wilson e o Conde de Wilson (filhos do fundador Edward Pellew Wilson), foi proprietário e diretor da firma “Wilson Sons”, que mantinha entre inúmeros negócios espalhados pelo país, a Companhia Bahiana de Navegação a Vapor, em 1881, com cerca de quinze vapores (BUENO & BARATA, Dicionário das Famílias Brasileiras, p. 1733-1734 – Vol. II e http:/pt.wikpedia.org/wiki/Eduardo Pellew Wilson J%C3%BAnior).
[v] É possível que esta gleba estivesse hipotecada pelo Coronel Bráulio, uma vez ser o proprietário um comissário de café, que a recebeu por pagamento da mesma.
[vi] Na referida escritura aparece também com a denominação de Fazenda Conceição, embora seja uma gleba que aparentemente não fazia parte das terras oriundas do Visconde de Guaratinguetá como é o caso da outra parte das terras, objeto de nossa análise mais adiante. Tal parte ainda não foi estudada, mas parece verídico alguma ligação das terras do Coronel Bráulio com as terras do Visconde e do Padre Manuel Teotônio de Castro.
[vii] João Carlos Nogueira de Sá era mineiro de Bapendí, casado com Maria Júlia de Oliveira César, neta do Visconde de Guaratinguetá. Foi proprietários de várias fazendas em Lorena, antes de se mudar para Jaboticabal, onde faleceu (MOURA, Carlos E. Marcondes de. 2 ed., P. 249).
[viii] Firma comissária de café, estabelecida a Rua de São Bento, sendo um dos seus sócios: Antônio José Marques d’Abreu Jr. (Arquivo Histórico de Lorena – Livros de Escrituras).
[ix] No período muitas fazendas da região estiveram nessa condição, nas mãos, principalmente, de firmas capitalistas ou bancos estabelecidos na Praça do Rio de Janeiro. Por vezes, quando não era satisfeito o pagamento total, ou estando parcialmente paga, a hipoteca era prorrogada e mesmo transferida para outros, que pagavam a divida pendente (com os juros), assumindo, portanto, o papel de credor junto ao proprietário. Embora não se tenha notícia, parece lógico que James Pellew Wilson seja um caso de hipoteca (objeto de transferência ou não) por não se ter provas do interesse do mesmo em investir em fazendas da região. Muitas hipotecas foram motivos de processos jurídicos denominados Executivos, em que o credor entrava com ação para receber a dívida.
[x] Nesse caso específico, a hipoteca foi realizada para garantir o pagamento pela compra da fazenda, avaliada pelo preço acima denominado. Apesar de não constar da escritura, parece que a negociação dos escravos foi paga no ato e paralelamente o dinheiro pago foi emprestado ao próprio pagador – João Carlos Nogueira de Sá.
[xi] As opiniões a respeito são diversas por não haver uma data especificada para a construção da sede da fazenda, também objeto do presente estudo. Segundo opinião do historiador José Luiz Pasin, por suas características, tem a sua construção realizada antes de 1860, o que parece correto afirmar, embora seja eficaz uma comparação arquitetônica mais apurada sobre o assunto, juntamente com análise do material empregado para a construção, na qual se baseia a opinião do professor Pasin.
[xii] A escritura não foi encontrada, mas acredita-se que seja de natureza pública, embora em algumas ocasiões, usava-se o expediente da escritura particular ou “de mão”, como era também designada a forma de expedir e reconhecer um documento de compra e venda. No tabelião público, por escrita peculiar e diferenciada da pública. A parte adquirida, com certeza, parte de terras, que mais uma vez foram anexadas na fazenda.
[xiii] Era usual o genro ou outro herdeiro receber alguns bens antes mesmo do falecimento. Nesses casos tudo era determinado formalmente por documento, que eram ou não apensos ao inventário, dando conta do recebimento antecipado. No caso específico acreditamos ter recebido pelo inventário, caso contrário, o major pode ter feito a doação por escritura pública, declarando ser em legítima de sua filha, entre 1873 e 1875, já que em 03/03/1873 (não localizada) a escritura de 1869 foi ratificada pelo Visconde e pelo Major Antônio Martiniano de Oliveira Borges.
[xiv] Embora a maioria tenha herdado partes não igualitárias, é possível que a fazenda e as terras tenham ficado em parte indivisas, isso porque não foram encontradas escrituras de compra e venda dos herdeiros para o Visconde, com a exceção do Alferes Joaquim da Silva Leme, Dr. José Martiniano de Oliveira Borges (Museu Frei Galvão/Arquivo Memória de Guaratinguetá - Livros de Distribuição de Escrituras – 1858-1859) O que pode ter ocorrido, em 1869, foi uma venda consentida dos herdeiros, que muito provavelmente receberam por fora as respectivas partes que lhes coube no inventário da mãe, o que era singular o conjugue sobrevivente ficar devendo a satisfação dos bens entre os herdeiros.
[xv] Silvéria Inocência de Gusmão faleceu em Lorena em 1859. No inventário, conservado no Arquivo Histórico de Lorena, as terras não aparecem mais, sendo descritos apenas bens de valor menor, entre eles, uma residência urbana. Era costume nas descrições de imóveis nas escrituras dos séculos XVIII e XIX referirem-se a proprietários anteriores, mesmo sendo outro o detentor, como a exemplo “o sítio que foi de Dona Silvéria Inocência”.
[xvi] Arquivo do Estado de São Paulo, microfilmado, rolo RT 18. O Registro Paroquial de Terras, realizado em todo o Brasil, teve origem na lei que procurou disciplinar e regularizar as terras e posses, e assim cada paróquia, tendo como responsável o vigário, os proprietários eram obrigados a fazer declaração de suas terras, dando-lhes origem e como foram adquiridas. No documento vem descritos estritamente, de forma irregular e inconstante, o nome, o tamanho, a denominação, o tipo de propriedade e os confrontantes.
[xvii] O Visconde, além das terras referidas, já possuía em 1856 outras porções de terras confrontantes com as mesmas, oriundas de compra realizada a outros pequenos sitiantes. Dentre as levantadas estão as terras localizadas no Porto do Meira (uma delas compradas em 26/11/1851 de João Batista de Azevedo e sua mulher Emidia Maria da Assunção) e no Macaco. As terras do Ronco, segundo o Registro de Terras, confrontavam com Dona Maria Pereira da Guia e Azevedo pelo lado esquerdo, pela testada (frente) rumando o sertão com terras de Marcelino José da Silva Borges (Porto do Meira) e com João Batista de Azevedo (herdeiro do Capitão Manuel Pereira de Castro) e outros (Registro nº 274).
[xviii] A propriedade do padre era denominada “Fazenda do Bonito”, como está descrito em seu inventário, realizado em 1872. Em seu testamento, a fazenda foi deixada para Dona Rita Antônia da Conceição, para que nela morasse e cuidasse até quando quisesse, ou até quando morresse. Em 1856, segundo o Registro Paroquial de Terras, o padre possuía também terras no Bairro denominado Vinagre.
[xix] Era proprietária da fazenda denominada do “Campo”, medidas judicialmente em 1849, tendo como confrontantes (1856) o Barão de Guaratinguetá, João José Rodrigues Ferreira, Marcelino José da Silva Borges e o Padre Manuel Teotônio de Castro (Registro de Terras – nº 06 – RT 18).
[xx] Tais informações estão baseadas nas declarações do Processo de Marcação e Demarcação da Fazenda Campinho, de Dona Maria da Guia, em 1849 (Arquivo Histórico de Lorena – Fls. 44), onde aparece uma escritura de venda que o Visconde de Guaratinguetá fez, em 1848, no Campinho, ao Coronel Joaquim Honorato de Castro. Falta retroceder e encontrar a origem dessa gleba.
[xxi] Pela totalidade de informações encontradas nos documentos fica uma dúvida sobre a formação de toda a fazenda do padre, pois quando da realização do inventário do Capitão mor, aquele já possuía terras na vizinhança do pai, segundo a descrição dos confrontantes. Até o momento o enfoque foi outro.
[xxii] Quadra de cima; posterior. Quadra – medida agrária variável; no sul do Brasil equivale a 132 metros.
[xxiii] As terras com 912 (2,2 metros) braças foram avaliadas na totalidade em 8:208$000 e foram divididas também entre os demais herdeiros, entre eles, a sua irmã, Dona Maria Pereira da Guia e Azevedo. No processo judicial de demarcação de terras desta última aparece a referida informação (fls. 43). O processo foi realizado três e um ano, respectivamente, após o inventário do Capitão e da sua mulher, este ocorrido em 1849. Dona Maria da Guia foi a primeira a realizar, já que tudo, então, estava pró-indiviso (sujeito a divisão ou partilha; imóvel em comunhão).
[xxiv] Ela também pode ter herdado alguma terra do primeiro e segundo marido, respectivamente Antônio Domingues Salgueiro e Coronel José Vicente de Azevedo (pesquisa necessária). Antônio Domingues Salgueiro era irmão do Capitão Mor Manuel Pereira de Castro e, portanto, tio e sobrinha. O Coronel era português (ver Carlota Pereira de Queiroz, p. 49).
[xxv] Não sabemos se a referida parte de terras foi anexada a fazenda vendida para o Visconde de Guaratinguetá.
[xxvi] Antônia Gomes Sandim era irmã do Tenente Francisco Gomes Sandim, casada com Silvéria Inocência de Gusmão, pais de Ana Silvéria Umbelina do Espírito Santo, 1º esposa do Visconde de Guaratinguetá. Parece que aí está uma parte da origem das terras de Dona Silvéria, herdadas pelo Visconde e anexadas às terras vendidas para João Carlos Nogueira de Sá.
[xxvii] Espaço da estrada, rua, onde termina, e que acompanha o longo da casa, quinta ou tapigo.

quarta-feira, 18 de março de 2015

O Município de Roseira – Pioneiro no Povoamento das Terras de Guaratinguetá


A formação histórica dos núcleos urbanos no Vale do Paraíba foi resultado de dois pontos importantes, os quais foram: em primeiro, o processo de ocupação do território pela necessidade da busca de mão de obra indígena e pedras preciosas, acompanhando a lógica do povoamento do território paulista desde São Vicente, seguindo as picadas e velhos caminhos indígenas serra acima até chegar a São Paulo e dali rumo ao Vale do Paraíba.  E, em segundo, a fundação de três importantes vilas no século XVII: Taubaté, Pindamonhangaba e Guaratinguetá. Todas três com extenso território administrativo e judicial. Principalmente a vila de Guaratinguetá, cujos limites estendiam-se até as divisas com a Capitania do Rio de Janeiro, no Rio Piraí, Parati (no alto da serra da Bocaína) e Minas Gerais, na divisa com a vila de Baependí.   Ambos possibilitaram, dentro desta realidade, o povoamento do que hoje é considerado o Vale do Paraíba Paulista. Ou seja, a ocupação sedentária de terras devolutas em zonas de fronteira agrícolas, em direção ao Rio de Janeiro e Minas Gerais, por famílias de migrantes saídos das Vilas de São Paulo, Mogi das Cruzes e cercanias. Assim como de imigrantes portugueses, principalmente a partir da primeira metade do século XVIII, agilizada pela abertura de um Caminho Novo para o Rio de Janeiro. Num longo processo de assentamento do homem na terra pelo único meio possível: a posse legal ou não de terras, a exploração da agricultura, para a maioria, e o comércio, para os poucos que já possuíam algum pecúlio e fazer considerável fortuna. O que criou já na segunda metade do mesmo século a necessidade, por parte do governo e da população, do desmembramento desses enormes territórios cada vez mais povoados. Constituindo-se num padrão para toda a região, o qual seria a exigência de certas áreas terem um governo municipal próprio por iniciativa da população (por abaixo assinados e plebiscitos) e acatamento nem sempre imediato dos pedidos. 
Dessa forma, a vila de Guaratinguetá foi perdendo gradativamente o seu imenso território com a criação de novas vilas e cidades. O que ocorreu até a segunda metade do século XX, com a emancipação de alguns municípios, dentre eles a cidade de Roseira, em 1965, cuja história, pré-emancipação, sempre foi reconhecida como da vila de Guaratinguetá. O que causa a ilusão de que o município nunca teve uma história anterior a ser resgatada.
No entanto, o município de Roseira é um velho território de povoamento, com uma história importante na formação social, econômica e política do Vale do Paraíba. Um pioneiro no povoamento das terras das Garças Brancas. Em linhas gerais, uma velha senhora jovem.
Ainda no final do século XVII, ocorrem os primeiros assentamentos imóveis em terras do município, em continuidade ao processo de ocupação de terras devolutas a partir e próximos da vila de Pindamonhangaba, em direção a Guaratinguetá, principalmente na margem direita do Rio Paraíba, acompanhando o antigo caminho São Paulo para o Rio de Janeiro, e a encosta da Serra do Quebra Cangalhas.  Na rota da antiga Roseira Velha e do outro lado do morro, no atual Bairro do Bonfim, região do Ribeirão dos Motas, onde existiram terras férteis, propícias para a agricultura e com ligação comercial direta com o Caminho Velho[i] para Parati, principal porto para escoamento de mercadorias.
As primeiras posses legais de terras, chamadas de sesmarias[ii], solicitadas por pessoas com famílias e doadas pelo governo da Capitania de São Paulo (antigo designação do Estado), ocorreram, algumas delas, ainda no final do século XVII e começo do seguinte. Embora não se tenha data exata, apenas por informações esparsas indicando nomes que até ainda permanecem.
Das mais antigas, foram as terras ao longo dos Ribeirão dos Motas, próximo das encostas da Serra do Quebra Cangalhas (Bonfim), cuja nominação provem de um antigo costume cultural de identificar o bairro com o sobrenome da família que no local estabeleceu remotamente, como uma espécie de identificador social.  Na localidade assentaram agricultura alguns filhos de Gonçalo da Mota Bitencourt e de Catarina Páscoa de Oliveira, naturais da Ilha de São Sebastião, cujos nomes eram: Salvador da Mota de Oliveira, casado com Maria do Rêgo Barbosa, e Pedro da Mota Pais, casado com Margarida Bicudo. Deixando imensa prole, com descendência até os dias atuais. E assim também o nome do bairro, que acabou por abranger um longo trecho até desaguar no Rio Paraíba. Bem como os descendentes de Francisco Borges Rodrigues e Miguel de Goés, todos do final do século XVIII, quando ainda o Vale do Paraíba passava por uma pobreza extrema, obrigando o homem assentar-se na terra, como uma das únicas opções de sobrevivência. E o mineiro, Capitão Luiz Dias de Almeida, proprietário de légua e meia de terras de testada na parte superior do Ribeirão dos Motas, na paragem chamada Cachoeira do Mato Dentro, comprada de outros mais antigos moradores anônimos: João Siqueira, Salvador Duarte, Rita Pais e Manuel Rodrigues da Fonseca.
O bairro, nesse trecho, foi um dos que mais prosperam em termos econômicos para a Vila de Guaratinguetá, principalmente no auge da produção do café na primeira e segunda metade do século XIX, com pequenas e médias propriedades, resultado dos diversos desmembramentos das sesmarias da família Mota Pais, por herança e por venda. Era a região com o maior número de propriedades agrícolas em 1856, segundo o Registro Paroquial de Terras[iii]. Tanto que já no final do período áureo do café e mesmo posteriormente, registra-se no Bairro do Bonfim grande prosperidade, com a presença de pequeno centro comercial para atender os moradores da cercania. E uma capela para as atividades religiosas e sociais da comunidade.
No período entre 1765 e 1836, segundo o Recenseamento das Ordenanças, a população local estava constituída de brancos e grande percentual de negros e mulatos, escravos e alforriados, trabalhando com a cana de açúcar e depois o café, também em pequenos sítios que além da agricultura para a exportação, eram voltados para a cultura de subsistência das famílias ou para o comércio de venda dos excedentes, entre os vários vizinhos e proprietários.  Militarmente, no começo do século XIX, pertencia parte para a 2ª Companhia (Aparecida), e outra para a 4ª Companhia das Ordenanças (Motas) da Vila de Guaratinguetá[iv]. Ali, nas décadas de 1840-1860 formaram-se importantes propriedades: A Fazenda Santana do Morro Alto, pertencente ao Major da Guarda Nacional[v], Bento Antônio de Campos, assassinado pelos seus escravos, em 1879, assim como o pai, em 1828, no município de Cunha. Ambos senhores de grande plantel de escravos, cuja má índole foi famosa em toda a região.  A fazenda da Conceição, até hoje existente. A Santa Leopoldina, de propriedade do Barão de Taubaté. E a fazenda de José dos Santos Oliveira Velho, também assassinado em tocaia por questão de briga judicial de terras, no qual episódio foi mandante outro rico fazendeiro da localidade, Manuel José Bitencourt. Ambos sepultados no Cemitério Senhor dos Passos, em Guaratinguetá.
Já no percurso da antiga Estrada Real, percorrida pelos Imperadores Dom Pedro I e Dom Pedro II, respectivamente em 1822, e na segunda metade do século XIX, nas encostas dos morros, na parte acima da dita estrada, inúmeras propriedades se formaram da mesma maneira, dando origem também ao antigo povoado de Roseira Velha, núcleo principal da comunidade até a metade do século seguinte.
Entre as importantes fazendas existem os exemplos, ao longo da estrada: A fazenda das Taipas, no também chamado bairro de Pirapitingui, que pertenceu ao Capitão Manuel Pereira de Barros e sua esposa, Francisca da Cunha Bueno, pais do Major Vitoriano Pereira de Barros, grande benfeitor de Roseira, que nas mesmas terras recebeu o Conde D’Eu, com uma história curiosa sobre o comportamento social dos fazendeiros na época. A fazenda Roseira, de propriedade de Máximo Monteiro dos Santos, casado com Benedita Francisca dos Santos. Nela a terra era cuidada pelo serviço de 21 escravos. A Fazenda Boa Vista pertencente a João Galvão de França e sua mulher, Dona Gertrudes Guimarães França, da mesma família da fazenda do Morro Vermelho, na entrada de Guaratinguetá, cuja sede, durante muitos anos, esteve em posse do saudoso Professor José Luiz Pasin e hoje abriga a Faculdade de Roseira – Faro.  E, por último, a Fazenda Veloso, de propriedade de Antônio Jacinto Guimarães e sua esposa, Dona Francisca Lescura França Guimarães.
Semelhante progresso econômico ocorreu nas imediações próximas do Rio Paraíba, atual Bairro de Pedro Lemes, limítrofe ao bairro do Itaguaçú, em Aparecida, cujo terreno fora fértil para o plantio do arroz. Ali recebeu, por volta da década de 1730, uma grande sesmaria o Capitão Amaro Lobo de Oliveira, residente na vila de Jacareí, que deixou grande descendência em Aparecida e em Guaratinguetá. Nela produzia seu sustento e tinha um engenho de cana para fabrico do açúcar e de aguardente.
Foram, portanto, por razão dessas propriedades, pioneiras glebas de terras, povoadas no século XVII e XVIII, que surgiu o município de Roseira, que se pode seguramente dizer que foi baluarte na manutenção do desenvolvimento da região de Guaratinguetá.
REFERÊNCIAS

Bibliografia

ARQUIVO DO ESTADO DE SÃO PAULO.  Sesmarias – 1720-1736.  São Paulo/Edição do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, 1937.

MOURA, Carlos Eugênio Marcondes de.  Os Galvão de França no Povoamento de Santo Antônio de Guaratinguetá.  3. ed. São Paulo, Ed. da Universidade de São Paulo, 1993.

SECRETARIA DE ESTADO DA CULTURA.  Repertório de Sesmarias.  São Paulo, 1994. Ed. fac-similar.

Fontes Primárias

ARQUIVO DO ESTADO DE SÃO PAULO. Recenseamento das Ordenanças de Guaratinguetá – 1765-1836.

ARQUIVO DO ESTADO DE SÃO PAULO. Registro de Terras de Guaratinguetá – 1856.

MUSEU FREI GALVÃO/ARQUIVO JUDICIÁRIO.  Inventários e Testamentos do 1º Ofício de Guaratinguetá – 1710-1962.

Imagem: Roseira Velha - Desenho de Tom Maia.


[i] Designação da antiga rota de Guaratinguetá para Parati, passando pela Vila de Cunha. Muita utilizada durante o período do ouro nas Minas Gerais. Daquela cidade portuária o ouro era transportado em navios para o Rio de Janeiro, e daí para Portugal. Foi, aos poucos, perdendo sua importância econômica com a abertura do Caminho Novo (antigo traçado de parte da Rodovia Rio-São Paulo, passando pelas cidades históricas do Vale do Paraíba).
[ii] Sesmarias eram porções de terras de tamanho variado, geralmente de meia légua de testada e uma de fundos, doadas pelo governo da Capitania de São Paulo para famílias que tinham pretensões de estabelecer benfeitorias e nela fazer produzir economicamente. Na maioria das vezes, eram solicitadas pelos interessados com possibilidade mínima de mantê-las produtivas. Ou compradas a outros e confirmadas por documento expedido pelo mesmo governo. Tendo o prazo de dois anos para medir e demarcar, com prejuízo de perder em caso de omissão.
[iii] Série documental existente por força da Lei de Terras promulgada em 1850, para que todos os proprietários pudessem declarar e legitimar a posse de suas terras. Era lavrada, em cada vila, pelo vigário da paróquia. Tornou-se documento comprobatório de terras utilizado até os dias atuais. Possui informações sobre tamanho da propriedade, tipo de aquisição, antigos proprietários e divisas.
[iv] As Companhias das Ordenanças (soldados) foram criadas em 1765, pelo Governador da Capitania de São Paulo, Morgado de Mateus, com o objetivo de recensear a população para fins de convocação militar de defesa do território e existiram até 1836. Cada companhia, geralmente representava um ou mais bairros da vila.  E com o passar dos anos passou a ter função exclusivamente econômica, trazendo inúmeras informações de cunho social, econômico, político e demográfico. As famílias eram recenseadas por fógos (domicílios), designando suas funções e sua produtividade a cada ano.
[v] Corporação militar criada em 1831, substituindo as Ordenanças, cujas funções variaram de acordo com o tempo, originalmente como corpo policial de defesa. Com o decorrer dos anos tornou-se símbolo de poder e mandonismo político, principalmente durante o Segundo Reinado. Das suas fileiras é que se originaram os antigos coronéis da política, com seus redutos eleitorais. Até pouco mais de meio século ainda existentes.

terça-feira, 10 de março de 2015

O Brasil Sob o Olhar de um Contrabandista


Acabo de ler o relato do viajante inglês Thomas Lindley, intitulado “Narrativa de uma Viagem ao Brasil”. Não é um romance, mas muito mais um documento histórico revestido de grande importância, assim como de tantos outros homens estrangeiros que visitaram o Brasil ao longo da sua existência. Muito menos é o mais utilizado e festejado dos relatos acerca do país, se comparado a Jean-Baptiste Debret e tantos outros. Ele é, acima de tudo, um relato do fim colonial brasileiro e algo substancial em termos de descrição do olhar europeu, diferindo, sobremodo, de outros vindos posteriormente.
É por acaso um diário do cotidiano dos homens, do seu governo, e dos seus costumes, embora sem a carga analítica da “Viagem Pitoresca Através do Brasil”, de João Maurício Rugendas.
Enquanto outros se detêm na descrição quase puramente física dos locais visitados, Thomas Lindley registra aspectos sociais importantíssimos para o historiador, de um período ainda pouco estudado e compreendido. Qual é o que antecede em alguns anos a chegada da Família Imperial ao Brasil, precisamente entre os anos de 1802-1803. A realidade de um país ainda governado por Vice-Reis e por Capitães-generais das Capitanias, permeado pelos interesses pelo público a favor do privado. Numa terra que prospera uma burocracia pessoal de favores, onde as decisões nem sempre eram as de Portugal.
A obra descreve o cotidiano do contrabandista, negociante e aventureiro fracassado de várias colônias, Thomas Lindley, enquanto prisioneiro em cárceres de Porto Seguro e Salvador, na Bahia, o qual foi feito prisioneiro quando desembarcou para reparos no seu brigue (não tinha finanças suficientes para pagar) e para consolidar certas negociatas com as autoridades ali estabelecidas, como no caso, com o Ouvidor Geral, seus parentes e outras autoridades.  Sem notícias dos inúmeros requerimentos encaminhados para as autoridades residentes e para Portugal, foi obrigado a ficar e, como desenlace, arquiteta sua fuga junto a amigos da mesma natureza e deixa o Brasil após longa residência forçada.
Trata-se de uma obra, classificada por alguns autores, como resultado do olhar de um homem de negócios, de caráter depreciativo, propício a comunicar má impressão sobre o país. Embora de agradável leitura e com algum espírito de exatidão e certa imparcialidade. E mesmo discordante em comparação a outros que visitaram o país na mesma época. Como o caso do príncipe Maximiliano de Neuwied, cuja impressão foi a de uma colônia onde não mais existiam tantos abusos, costumes ridículos, hábitos antiquados e discordantes do espírito do período, como os observados pelo negociante Lindley. Diferentemente do que observou Lindley, entre outras coisas. Entre eles, o horário das refeições, durante as quais as pessoas do maior respeito e autoridade deixavam os talheres de lado para saborear a comida com as mãos (LINDLEY, 63: 1969).
Impressa em 1805 e depois 1806 (edição francesa e alemã), a obra é o rastro e o fio para pensar as várias partes do Brasil no mesmo período para uma pesquisa reflexiva sobre a maneira de viver na colônia.  Notadamente temáticas para o convívio social da população do Vale do Paraíba, que em certos estudos já foram esmiuçados.
Entre os destaques: a temática da morte, a extrema unção, o cerimonial de sepultamento; roupas e hábitos de vestir; dieta e alimentação; a conduta dos militares e a justiça; o delicioso costume de “arrancar piolhos”; a saúde pela epidemia generalizada da sarna; modos de plantio da mandioca, a medicina pelo método da sangria e a varíola sempre constantes nas partes do país; descrição das prisões, a mercê da medalha da Ordem de Cristo e os santinhos de proteção; usos e costumes das mulheres; feitiços, rezas e mandingas; os embustes da justiça; as missas pagas, o latim e os jesuítas; as relações sociais do empregado branco e o patrão; os músicos negros, o tramites do processo judicial, o comércio ilegal de alguns produtos; o comportamento dos soldados militares; as festas religiosas; penas de traição; e a literatura do período. Entre tantos outros temas que se constituem pontos de partida para pesquisa na região do Vale do Paraíba. E que os documentos, em série principalmente podem trazer ao crivo do historiador para analisar os aspectos sociais, econômicos e políticos. 

quarta-feira, 4 de março de 2015

Gênese da Primitiva Capela de Aparecida

A Igreja de Nossa Senhora Aparecida representa um símbolo perpétuo da essência histórica do Brasil desde os primórdios da colonização portuguesa. Representa as diversas fases do desenvolvimento econômico, social e político do país. E acima de tudo denota a forte influência do catolicismo no modo de pensar e agir da população, com as tonalidades do sacro e do profano convivendo juntos numa dinâmica contínua de transformações. Ela é o microcosmo profundo da história brasileira.  Onde a vida se fez de maneira imperceptível aos olhos dos historiadores e das pessoas comuns. Com conflitos, acomodações, amores, paixões, discórdias e, acima tudo, partilha de inúmeros e diferentes interesses.
Na primeira fase, de origem e construção, ela já nasce representando certa inversão de motivos pelos quais surgiu.  Diferindo das demais e tradicionais capelas espalhadas por todo o país, eretas a partir de um motivo político específico: da criação jurídica e administrativa de vilas e cidades, no qual o templo religioso desempenhava papel fundamental na congregação de pessoas através do exercício e desenvolvimento do espírito cristão. 
Sua construção derivou de um plano místico e sagrado pré-existente, dado pela fé nas crenças e nos ensinamentos da Igreja Romana estabelecida no Brasil. E disseminada por agentes coloniais portugueses com intuito de evangelizar e catequizar a população branca pobre, indígena e negra, dentro dos preceitos preconizados pelo Concílio de Trento. Alimentado pela forte devoção nos santos e na Santíssima Trindade. E, sobretudo pelo encontro de uma imagem (1717) atribuída como sendo da Virgem Maria, Mãe de Deus, Nossa Senhora. Semelhante a tantos outros ícones existentes na tradição artística nacional (terracota), em suas diversas designações (Nossa Senhora do Bom Sucesso, Nossa Senhora da Conceição e outras).
Dá-se a partir do encontro da imagem no fundo do rio e depois o seu resgate inusitado, e daí o milagre que se constituiu: a pesca abundante de peixes, num ambiente colonial caracterizado por extrema pobreza. E posteriormente pela devoção cada vez maior diante de outros milagres acontecidos. Obrigando as autoridades civis e eclesiásticas a constituir orago e altar próprios, sem embora constituir em núcleo populacional independente da vila de Guaratinguetá, no qual o território estava incluído as terras doadas para a edificação no final da metade do século XVIII. 
E sua importância, nesse período, se concretiza pelo aspecto religioso do sacrifício e da glorificação dos fiéis peregrinos por sua localização no alto do morro, visível e alcançável. Em cujo cume o homem comum e sofrido estava em plena comunhão com a “Corte do Céu” e com seus santos e anjos. Alcançando graças, pagando promessas e renovando sua crença na ajuda por uma vida melhor.
Bem como na semelhança que traz com tantas outras histórias capelas.  No florescimento de um núcleo urbano rarefeito, em cujo entorno surgiram construções irradiadoras de povoamento e constituição de outros bairros. Desempenhando um papel de estruturação das relações social, econômico e político, refletidas nos séculos seguintes com a simbiose entre o sacro e o profano para dela se retirar proveito pela via da fé pura e simplista. 
No decorrer dos outros séculos, a situação mantêm-se em parte, mas tornar-se uma realidade bem mais do que religiosa.
Houve o interesse da partilha econômica que o fenômeno religioso e a peregrinação dos fiéis trouxeram para o entorno e para as áreas situadas nas rotas de acesso ao templo.
Com a doação do patrimônio para a constituição das “terras da Santa”, principalmente por Margarida Nunes Rangel (morro dos Coqueiros e ruas Monte Carmelo e Oliveira Braga) e Lourenço de Sá (nas cercanias da atual Rua Barão do Rio Branco) grande parte foi arrendada por pequenos sitiantes e agricultores, mediante pagamentos dos foros (aluguel), procedimento que durou por mais de cem anos.
Nesses locais foram construídas casas de residência, pensões, casas de comércio, principalmente no grande praça fronteira, o que movimentou certo comércio incipiente no local para atender o número cada vez maior de fiéis, principalmente na Estrada Geral para São Paulo, que foi rota de tropas, de viajantes e migrantes para outras partes do país. E isso gerou choque de interesses entre a igreja, os aforados e proprietários de terras limítrofes nas intenções de exploração. Sendo inúmeros os casos de briga e inimizades.
Afora os interesses políticos intervindo na administração dos bens da capela, entre o público e o privado, graças, notadamente ao regime do Padroado instaurado no país ainda no período colonial, quando não havia a separação entre a Igreja e o Estado no que toca a administração.
E muito tempo depois outros conflitos entre os seculares, os civis, e a Congregação Redentorista, que via na administração algo de suspeito e não muito bem conduzido.
Mas isto é outra matéria a respeito das influências da capela e igreja no morro das Pitas e no seu entorno em toda a história.

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

Conselheiro Rodrigues Alves Revira na Tumba

Nunca soube, por nenhuma fonte escrita ou oral, que o Conselheiro Rodrigues Alves tenha professado o espiritismo. Pelo contrário, em vida, ao que se sabe, foi extremamente católico e fiel aos ensinamentos cristãos, aplicando-os no cotidiano da política, no executivo, no legislativo, e mesmo afastado dos cargos públicos eletivos. Exercia o seu catolicismo principalmente na família, que cuidou com esmero ao longo de grande parte da vida. Respeitando até a sua viuvez, para o resto de sua existência terrena. As cartas da filha Catita que digam. Atualmente conservadas no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.
Mas o que aconteceria, entre tantos fatos possíveis, se o Conselheiro fosse um discípulo de Alan Kardec. Penso que, não estando reencarnado, estaria observando a política brasileira e paulista.
Horrorizado, principalmente, com a displicência sobre sua memória terrena. Sem trégua estaria revirando na tumba, pelo descaso com parte de seu significativo legado. Amargamente enxergando o que o seu Estado e a sua Cidade, por seus políticos inertes e obliquamente inteligentes, estão fazendo com aquela que foi a sua casa e hoje é o imóvel fantasma que um dia foi o dinâmico Museu Conselheiro Rodrigues Alves. Onde ainda está abrigado parte do seu cotidiano de vida. Memória e história em abandono, entregue a toda sorte de elementos naturais destrutivos, sem chance de reconstituir, pelo menos em sua grande parte.
Fechado por mais de cinco anos, o que atualmente ainda resiste é apenas resquício do que foi o conjunto exposto ao público desde a sua abertura. O acervo está sendo destruído pelo cupim, alojado quase que exclusivamente numa sala, onde a umidade também impera e é impiedosa.
O prédio, reformado (e não restaurado), reiniciou o processo de degradação física, comprovando o dolo com o dinheiro público dos políticos responsáveis, que continuam a brincar com a coisa pública. Tratam-no como coisa privada, objeto de barganha política com interesse notoriamente eleitoreiro, sem nenhuma finalidade cultural para a comunidade.
Dizem que o erário municipal não tem condições de mantê-lo, mas recordo que ele sempre funcionou com quase nenhuma verba, fosse estadual ou municipal. Os últimos funcionários chegaram mesmo a trabalhar um ano gratuitamente para o Estado, com o afinco de não deixar morrer o ideal de preservar a memória e a história. Divulgando a cultura local e regional. E funcionou desse modo durante muitos anos. Portanto, é mexerico e inverdade, e mesmo desculpas esfarrapadas, dizer que não tem condições de reabrir a instituição e mantê-la funcionando.
Querem sim, usá-la como instrumento de troca, de favorecimento, com claro intuito demagogo como sempre foi. Querem transformá-lo em secretaria municipal sem nenhum planejamento anterior, para virar um local sem identidade própria. Preferem ganhar mais um espaço público dito cultural, no caso um teatro para a cidade, em troca de geri-lo. Cujas negociações se arrastam por parte do Estado e do município sem nenhum resultado. Uma briga de figurões da vaidade que emperra o processo de municipalização. Que ainda tem que passar pelo crivo da Câmara Municipal. Museu e teatro jogados para a ruína, pelo delírio de pessoas pouco afeitas ao raciocínio do bom senso.
O descaso chegou ao Ministério Público, mas por “forças ocultas” até agora não se manifestou em termos concretos. E muito menos puniu os verdadeiros responsáveis por tamanha barbárie cultural. Parece que não conseguem chegar a um consenso sobre. As partes se manifestam usando os argumentos mais pífios. Para safar da incúria e da odiosa falta de compromisso. Cada hora é um argumento; a cada momento um instrumento jurídico interposto para ganhar tempo, fugir da responsabilidade e nada fazer. E se fizer, serão da maneira mais desastrosa, antiética, e nada profissional. Similar a um trampolim ou poleiro para apadrinhados. 
Até quando o Conselheiro Rodrigues Alves, de sua tumba, vai gritar por socorro. E ver que aquilo que tanto prezou em vida está se perdendo. Perde-se o patrimônio do povo e perde-se a lisura, a honestidade e a boa vontade por parte dos homens públicos. Certamente está consciente de que não existe mais governo sério, que não cuida do público, e que apenas priorizada a vida privada.
Podem ter certeza, caros leitores, ainda existe solução para o Museu Conselheiro Rodrigues Alves. E mais ainda, pessoas disposta a dar o suor para colocá-lo novamente ao alcance da comunidade. Ideias existem, mas ninguém consulta os verdadeiros profissionais que sabem e bem fazem um bem maior pela cultura.
Não vamos acreditar em dificuldades financeiras, nem em outras desculpas, muito menos em boas intenções. Disto, o inferno está cheio.
Imagem: BIBLIOTECA NACIONAL. Gazeta de Notícias - 14/08/1904. 

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

O Alferes João Ferreira Guimarães e a Fazenda Pau D'Alho

A abertura do Caminho Novo, do Vale do Paraíba para o Rio de Janeiro, durante o século XVIII, foi fundamental para criar novas oportunidades econômicas para a população de diversas vilas da região e contribuiu para a migração de um grande número de indivíduos vindos das Minas Gerais. Especialmente saída de Guaratinguetá, Lorena e outras vilas da região. Proporcionando, desse modo, a possibilidade de exploração e povoamento de uma nova zona de fronteira agrícola aberta no atual território do Vale Histórico (Bananal, Areias, etc.), em direção a São João Marcos, litoral fluminense (Angra dos Reis e Mambucaba), Fazenda de Santa Cruz, e finalmente a sede da Colônia. Facilitando, com isso, a concretização de fatores preponderantes para o desenvolvimento da região, logo após a queda da mineração: a ocupação e proveito de imensas áreas devolutas; o escoamento terrestre da produção agropecuária para o comércio carioca, sem a necessidade de percorrer o exaustivo roteiro por Parati; a possibilidade de enriquecimento de pequenos agricultores e comerciantes; o efetivo combate ao contrabando de ouro das Minas Gerais; e o aparecimento de novos núcleos urbanos, onde prosperou a plantation do açúcar, do café e dos produtos de subsistência e de origem animal, no século que se seguiria.
A construção do caminho, seguindo pelo rumo da rota das boiadas, teve inicio ainda na primeira metade do século XVIII com as primeiras investidas de Domingos Antunes Fialho e de outros moradores das vilas de Guaratinguetá e Lorena. Tendo somente sido concretizado depois de 1760, quando o Capitão mor de Guaratinguetá Manuel da Silva Reis assumiu a empresa, terminando-o na década de 1770, quando por ordem real recebeu poderes para distribuir terras em grandes sesmarias aos solicitantes, que teriam condições de desbravar, cuidar e cultivar o sertão inculto á margem da serra da Bocaína.
Nesse período, muitos mineiros desceram a serra em direção ao Vale do Paraíba em busca de novas oportunidades, devido ao desgaste das terras auríferas, ao alto preço da derrama, e ao episódio da Inconfidência Mineira. Estabelecendo residência na região do Vale do Paraíba Paulista e fluminense. Como foi o caso do Alferes João Ferreira Guimarães, português nascido (1750) na Freguesia de São Martinho de Silvory, termo da Vila de Guimarães, Arcebispado de Braga.
Após ter imigrado para o Brasil, juntamente com os pais (Thomé Álvares Pinto e de Catarina Ferreira), estabeleceu residência nas Minas Gerais, na região aurífera de Aiuruoca, entre as décadas de 1770-1780. E nessa localidade casou com Isabel Maria de Souza[i]. E depois de ter residido em Rezende[ii], por breve período de tempo, transferiu moradia para a região do Caminho Novo, onde criou laços familiares sólidos, deixando história e numerosa descendência.  Levantando engenho e fazenda que deram origem a algumas das principais fazendas de café, notadamente a Fazenda Pau D’Alho. Ficando conhecido como o “Velho da Serra” [iii].
Nessa localidade solicitou doação ao governador da Capitania de São Paulo, Capitão-General Bernardo José de Lorena, de uma sesmaria, próxima das terras onde futuramente seria elevada a futura vila de São José do Barreiro, termo da Vila de Lorena, onde já possuía outras terras e fixou residência. Recebeu-a em 07/10/1796, em parceria com Antônio da Silva de Siqueira e David do Prado Machado, na rota da Estrada Geral, na paragem denominada Barreiro (ou Ribeirão do Barreiro), com

“... novecentas braças de terras de testada na estrada, que vai para o Rio de Janeiro e huma légua de certão meya para cada lado do dito Caminho, partindo de hum lado da parte de leste em terras do Guarda mor Pedro da Cunha, e da parte do Este com terras do mesmo Suplicante...” [iv].

que ficou anexa[v] as outras contíguas de sua posse, adquiridas por compra que fez da sesmaria de Antônio João de Araújo (recebida em 12/08/1785 e revalidada pelo Alferes)[vi] e de Antônio da Silva de Siqueira e sua mulher, Maria Moreira, em 04/09/1792[vii]. Assim descrita no documento de compra:

... Hum citio e terras na Estrada do Caminho Novo na paragem chamada o Ribeiram do Barreiro, termo dito da villa de Lorena: cujo citio consta de huas cazas de vivenda com três lansos cubertas de Telhas e parede de mam com seis portas, e três jannelas; e assim mais hum lanso de casa cuberta de telha, que serve de cuzinha; e assim mais dois lansos de caza também cuberta de telha, que serve de payol: com hum Monjollo, e arvoredos de Espinhos, e assim mais quatro lansos de caza cuberta de telhas, que serve de Ranxo de passageiros: e tudo se haxa cituado em hua sorte de terras, que tem de Testada nove centas Brassas medidas pela Estrada; ou o que se achar emtre o marco que divide as terras do dito comprador Joam Ferreira Guimaraes, e o marco que divide as terras do Guarda mor Pedro da Cunha, com cujos partem as ditas Terras: e com mea Legoa de Sertam para cada lado da Estrada servindo a mesma de Piam; cujas terras disseram elles vendedores que as ouveram por lhes haver dada em nome de Sua Magestade o Capitem Mor Regente do destrito Manuel da Silva Reis, de que lhes passou hua sédulla, ou consesam, em virtude da qual elles ditos vendedores as tem Logrado, possuído, e cultivado com posse pessoal, e atual, há bastante annos, sem contradissam de pessoa algua cujo citio, e terras asima declarados, disseram elles outorgantes vendedores, que vendiam, como com effeito vendidos tinham de hoje para todo o sempre a Joam Ferreira Guimaraes, por presso e quantia de quatro centos e sincoenta mil reis em dinheiro, moeda corrente deste Reino, que confessaram elles vendedores haverem recebido do que dou fé...  

Com isso, desenvolveu, nas terras adquiridas e anexadas, o engenho de açúcar, a fazenda de criar e rancho de tropas e, posteriormente a fazenda de café, no decorrer do século XIX. Propriedades que permaneceriam na família até meados do século seguinte, conhecidas como Fazenda Pau D’Alho (segunda metade do século XIX) Barreiro e Engenho do Barreiro (primeira metade do mesmo século). Desmembradas por partilha a partir da década de 1810 entre os inúmeros herdeiros deixados[viii]. Ficando, porém, em situação pro-indiviso[ix], em comum com todos os titulares, segundo afirmação extraída do inventário da herdeira Anacleta Ferreira de Souza, esposa do Capitão Fortunato Pereira Leite, em 1835[x]. Mas plenamente reconhecida em termos de extensão por cada qual, no Registro dos Bens Rústicos[xi].
Por ocasião da declaração desses bens imóveis, exigida pelo governo do Reino Unido de Portugal e Algarves (1817), a Fazenda Pau D’Alho[xii] (905x4500)[xiii] e Barreiro (810x750) estavam na posse do Capitão João Ferreira de Souza; e o Engenho do Barreiro como propriedade da viúva, Isabel Maria de Souza (3242x3000); e a Fazenda Carrapato, sob os cuidados do Capitão Francisco Alves da Cunha Carvalho (2116x3000) [xiv].
Em 1819, pelo inventário de Maria Isabel de Souza, tem-se certo perfil da estrutura de uma dessas propriedades, o Engenho do Barreiro, enquanto uma unidade de produção e comercialização mista no período açucareiro e pré-cafeeiro. Comandada por uma mulher por cerca de quinze anos.
No rol dos bens fica claro duas frentes de plantio característica da época, sem mencionar, porém, o volume de produção de ambas. Aparecem alguns quartéis de cana, avaliados em 80$000; e alguns de café, em 84$000; e 50 alqueires[xv] de café para socar (80$000). O que denota período ainda de pouco fausto, em que o resultado financeiro parece ainda pífio. Cuja orientação direcionava-se para uma vida de subsistência, numa unidade autossuficiente. Mas que não deixou de proporcionar uma vida doméstica com certo conforto. Apesar de, em 1817, a viúva aparecer recenseada, com 62 anos, em São José do Barreiro-SP, apenas designada como agricultora, com 16 escravos ao seu serviço, com uma cultura de subsistência[xvi].
O monte mor foi orçado em 14:830$995, grande parte no valor das terras, avaliadas no total de 9:115$200 (61,5%), seguido do valor de 2:414$000, referente ao plantel de escravos (16,3%), e as benfeitorias, somadas em 1:194$000 (8%). Assim como as casas e os móveis em 1:562$850 (10,5%). As dívidas ativas[xvii] foram poucas, no total irrisório de 562$945 (3,7%). E as passivas em 2:198$249[xviii] (14,8% relativo ao monte mor), ao herdeiro Capitão João Ferreira de Souza, e ao co-herdeiro[xix] Capitão Joaquim Lopes Guimarães, e despesas com o Padre Manuel Antônio e com o funeral. Sendo que para o herdeiro Capitão João Ferreira de Souza existia pendente “que toca de sua braça por parte Materna...[xx], distribuída entre dívidas de outros herdeiros ao monte do inventário, meio dote, escravo, terras, e trastes agrícolas[xxi].
Neste sentido, os bens rurais representavam o grosso dos bens, notadamente as terras, escravos e as benfeitorias que davam o sentido de sobrevivência da família e certo luxo que começava a despontar naquele inicio de século, principalmente com produtos importados da Europa.
No quesito bens de raiz[xxii], vê-se como estava constituída a parte física da sede, dividida entre casas de morada, a casa do paiol, cozinha, casa no terreiro, paiol, monjolo, galinheiro, senzalas, engenho com seus pertences de madeira. Como assim também casa casas de moradas na vila, na rua direita, com portas e janelas, na vila de São José do Barreiro, e mais dois lanços de casas cobertas de telha com porta e janelas, na vila de Rezende[xxiii].
De uso pessoal corporal, peças de ouro, representado por caixilhos e cordões com crucifixo. De uso doméstico, de prata, cobre e ferro, utilizados na cozinha: colheres para chá e tirar açúcar; facas com cabo de osso, chocolateira[xxiv], tachos, caldeirões, bacias, almofariz[xxv], bandeja, candeias, escumadeira[xxvi], jarros, copos de vidro em tártaro e com mercúrio, pratos de louças (33), xícaras e pires, canecas, bule, tigelas de louça, açucareiro, leiteira, frascos e panelas. Nos quartos foram vistos e avaliados: catres, tamboretes, cadeiras de diversas formas e utilidades, mesas, bancos, estrado, toalhas de paninho bordadas de linho, guardanapos e mancebo. E no serviço de quarto: lençóis e fronhas de bertanha[xxvii], colchas forradas de elefante, colchas de lã de Minas, colchas de algodão de São Paulo, colchas de baetão[xxviii] e retalhos, etc.
A indumentária consistia em vários tipos roupas feitos de diversos tecidos, mantas, chapéus, camisas de morim da Irlanda, saias de linho e de Bertanha, chinelas, etc. Além de aparato para corte e costura. E vários tipos de móveis, incluindo um oratório com todas as suas alfaias.
Para os serviços profissionais, diversos instrumentos agrícolas e para oficina de carpintaria e para uso do engenho. E para a realização desses dezesseis escravos, com idades variando entre sete e trinta anos. Bem como animais para uso interno do engenho e fazenda.
Com todas essas informações, embora precárias, infere-se que em momentos específicos a situação sócio-econômica de João Ferreira e de sua família é bem clara.
Com a sua chegada aos arredores da futura São José do Barreiro, a pujança não parece ter sido uma constante, mesmo em se tratando da sede da fazenda ainda ser construída por técnica antiga e simples, em estilo despojado de luxo. Muito mais ao estilo da vida prática e dura daqueles tempos, visando a operacionalização do usufruto da terra.
Em pouco mais de dez anos de assentamento em Barreiro, João Ferreira apenas trabalha na montagem e investimento da sua agricultura, voltada necessariamente para o sustento da família, investindo no excedente da produção, vendendo-o para o Rio de Janeiro. Período que pode ser caracterizado como campesinato, de situação quase inferior dentro dos quadros da sociedade, na labuta diária para ascender econômica e socialmente. E ocupar posição de certo destaque, em preparo ao futuro dos filhos, que serão aqueles que realmente desfrutarão do sucesso da cultura cafeeira mediante as heranças paternas e maternas. Totalmente estruturadas em termos físicos (sem os gastos com a aparelhagem de uma unidade de produção) e em prestígio social.
A partilha dos bens, nesse caso, e como acontecia na maioria da economia brasileira, foi fundamental para deixar os filhos com quinhões satisfatórios de terras propícias para o cultivo da rubiácea. As sesmarias recebidas e as demais anexações de terra por compra, já partilhas, foram transformadas em unidades potencializadas, com sedes portentosas, com desfrute de luxo, pela riqueza e pelo status social substancial.
No momento de sua morte suas benfeitorias produziam açúcar, aguardente e era fazenda de criar, estando em pleno funcionamento naquele inicio do século XIX. Proporcionando estabilidade e conforto. O que possibilitou ingressar politicamente na comunidade que ajudou a fundar, ocupando o posto de Alferes das Ordenanças[xxix] da vila de Areias. Embora fosse cargo inferior ao de capitão.  
Uma segunda situação, pós-morte do titular, é quando a viúva e os filhos assumem a gerência das unidades, coincidindo com o período de transição da cana para o café. É o momento em que todos, sob o regime da mão de obra escrava e dos filhos, trabalham para manter o nível de sustentação econômica e social, tendo cada herdeiro auxiliado a viúva na direção dos negócios, mesmo que alguns deles já estivessem independentes e casados. Cada qual construindo o seu próprio viver.
Por esse tempo, a Fazenda Pau D’Alho passava das mãos do alferes para um dos filhos mais velhos, o Coronel João Ferreira de Souza, que pelo entender dos documentos foi o responsável pela montagem definitiva de sua sede, aparelhando-a com maior número de senzalas, dando-lhe a feição similar de feudo autossuficiente. Como se percebe, em 1858, no inventário do mesmo coronel, cujos dados constantes denotam uma fazenda de natureza mista, de plantação de café (212 mil pés), criação de animais (carneiros, porcos, etc.) e de serviço de tropas (30 bois de carros e 115 bestas, sendo alguns arreados). Em que o monte mor[xxx] alcançou a cifra de 768:807$530. Sendo a maior parte no valor dos escravos (58,7%), constante de 302 almas. E o restante nas dividas ativas (20,4%); terras (9,1%); casas urbanas e rurais (4,3%); cafezais (4,8%); animais de criação e de tropa (2%); ouro e prata (0,3%); móveis (0,1%); cobre e ferro (0,09%)[xxxi].
O Alferes João Ferreira Guimarães faleceu por 1803, em São José do Barreiro, então freguesia de Areias, na Capitania de São Paulo, com testamento[xxxii]. Nomeou como seus testamenteiros, em primeiro lugar a sua esposa, Isabel Maria de Souza; em segundo lugar ao filho João Ferreira de Souza; e em terceiro a outro filho, Francisco Ferreira. Expondo, entre tantas disposições: prazo de quatro anos para que se apliquem todas as determinações testamentárias; que o seu corpo fosse envolto no Hábito de São Francisco (da qual era irmão); que seu corpo fosse acompanhado pelo reverendo sacerdote da vila, por todos outros sacerdotes presentes; que se dissessem duas missas de corpo presente e que o seu corpo fosse sepultado na matriz da vila.
Deixando os seguintes filhos: Capitão João Ferreira de Souza; Alferes Francisco Ferreira de Souza; Mariana Ferreira de Souza; Isabel Maria de Souza; Tereza Maria do Nascimento; Ana Joaquina Ferreira de Souza; Margarida Ferreira de Souza; Catarina Ferreira de Souza; Inês de Santa Leocádia; Anacleta Joaquina Ferreira; José Ferreira de Souza; e Maria Ferreira de Souza.


[i] Batizada por 1755, na antiga freguesia dos Prados, filha de João de Sousa Freitas e de Maria Emerenciana de Santana. e f. com testamento em 25/03/1819, na mesma localidade de Areias.
[ii] Segundo Itamar Bopp, o Alferes Guimarães saiu das Minas Gerais devido a implicações na revolta mineira, juntamente com outras tantas famílias mineiras que se estabeleceram nessa região nesse período. Arquivo Itamar Bopp – Acervo digitalizado.
[iii] Não foi possível descobrir a origem e o porquê do apelido. Tais designações foram comuns e estavam ligados a fatos dos mais curiosos. Desde o local de moradia ou as características pessoais do portador, entre tantos motivos.
[iv] ARQUIVO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO. Repertório de Sesmarias, p. 229.
[v] Anexação de terras significava adquirir propriedades de vizinhos limítrofes, fosse por compra, troca ou em pagamento de dividas, de parentes ou não. Com o objetivo de expandir o empreendimento agrário ou aumentar o status social.
[vi] MOURA, Carlos Eugênio Marcondes de (org.) Fazendas de Café do Vale do Paraíba – o que os inventários revelam (1817-1915). Governo do Estado de São Paulo/Secretaria da Cultura, 2014. p. 294. “... Francisco da Cunha Menezes, do Concelho de Sua Magestade Fidelissima-Governador e Capitão General da Capitania de São Paulo, etc. Faço saber aos que esta minha carta de Sesmaria virem que attendendo a me representar Antonio João de Araujo morador no termo da Villa de Goaratinguita que fazendo o Capitão Mor da mesma Vila Manoel da Silva Reis, repartição das terras devolutas, no caminho novo que abrio para a Cidade do Rio de /01/, por ordem que para isso teve o meu anteceçor, deo a elle Suplicante huma sorte na paragem chamada o Barreiro, que comprehende huma legoa de testada, correndo pelas voltas do dito caminho de Leste ao este, em hum legoa de Certão a saber meia legoa do caminho para baicho, e outra meia legoa para sima, em rumo de Norte a Sul no dito Certão, partindo as ditas terras da parte do Rio de /01/ com as de Antonio da Silva, e da parte da referida Villa de Goaratinguita com Bento Francisco Teixeira...”.
[vii] MOURA, Carlos Eugênio Marcondes de (org.) Fazendas de Café do Vale do Paraíba – o que os inventários revelam (1817-1915). Governo do Estado de São Paulo/Secretaria da Cultura, 2014. p. 294.
[viii] Apesar dos nossos esforços, não foi possível encontrar o inventário de João Ferreira Guimarães.
[ix] Essa situação foi muito comum no período colonial e no Império, com o objetivo de evitar, entre tantas outros, as brigas judiciais e posses irregulares. Correspondia a situação do imóvel não medido e repartido judicialmente, sendo uma convenção respeitada, na maioria das vezes, pelos herdeiros.
[x] MOURA, Carlos Eugênio Marcondes de (org.) Fazendas de Café do Vale do Paraíba – o que os inventários revelam (1817-1915). Governo do Estado de São Paulo/Secretaria da Cultura, 2014. p. 299.
[xi] Arquivo Público do Estado de São Paulo. Tombamento dos Bens Rústicos, 1817. Nessas declarações, muito simplificadas, o responsável, em cada vila, pela escrituração, registrava o nome do proprietário, o nome da situação rural, sua extensão em braças de testada e fundos, se estavam cultivadas e por quem, o número de escravos, e a residência do proprietário. Diferentemente de algumas localidades, como exemplo as vilas de Cunha e São Luiz do Paraitinga, em que aparecem também os limites e as confrontações. O seu significado indicava bens imóveis rurais, incluindo terras e mais benfeitorias a ele pertencentes, cuja preocupação foi o controle sobre a existência de terras devolutas e do seu real aproveitamento.  
[xii] Não foi possível definir em quais das sesmarias assentou-se a sede da fazenda Pau D’Alho, pela falta de documentos e por ser confusa o computo de braças de terras dos herdeiros declarados no Tombamento dos Bens Rústicos.
[xiii] Lê-se 905 braças de testada por 4500 de fundo, cada uma correspondente a 2,2 metros.
[xiv] Arquivo Público do Estado de São Paulo. Tombamento dos Bens Rústicos, 1817.
[xv] Medida equivalente a cerca de oito sacas de café. SILVA, Antônio de Moraes e. Diccionario da Lingua Portugueza. 4 ed., Lisboa, Imprensa Régia, 1831. Volume 1. Embora não saibamos o peso da saca.
[xvi] Arquivo Público do Estado de São Paulo. Maços de População de Areias – 1817 - fógo 274. Acervo Digital.
[xvii] Dividas de outros para com o inventariado.
[xviii] Dividas do inventariado para os outros.
[xix] Herdeiro indireto, netos ou esposos(as) dos herdeiros.
[xx] ARQUIVO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO. Repertório de Sesmarias, p. 229.
[xxi] MOURA, Carlos Eugênio Marcondes de (org.) Fazendas de Café do Vale do Paraíba – o que os inventários revelam (1817-1915). Governo do Estado de São Paulo/Secretaria da Cultura, 2014. p. 294.
[xxii] Bens de raiz referiam-se a terras, casas rurais e algumas vezes as benfeitorias.
[xxiii] MOURA, Carlos Eugênio Marcondes de (org.) Fazendas de Café do Vale do Paraíba – o que os inventários revelam (1817-1915). Governo do Estado de São Paulo/Secretaria da Cultura, 2014. p. 293.
[xxiv] Vaso de folha de cobre, ou de lata, que serve para fazer o chocolate. SILVA, Antônio de Moraes e. Diccionario da Lingua Portugueza. 4 ed., Lisboa, Imprensa Régia, 1831. Volume 1.
[xxv] Pilão de metal. SILVA, Antônio de Moraes e. Diccionario da Lingua Portugueza. 4 ed., Lisboa, Imprensa Régia, 1831. Volume 1.
[xxvi] Colher de metal, quase chata, cheia de buracos para limpar a calda de açúcar e outros líquidos de cozinha. SILVA, Antônio de Moraes e. Diccionario da Lingua Portugueza. 4 ed., Lisboa, Imprensa Régia, 1831. Volume 1.
[xxvii] Lençaria de linho fina, que se traria da Bretanha (França). SILVA, Antônio de Moraes e. Diccionario da Lingua Portugueza. 4 ed., Lisboa, Imprensa Régia, 1831. Volume 1. Na linguagem coloquial, ou mesmo formal, falava-se Bretanha.
[xxviii] Tecido grosso, felpado. SILVA, Antônio de Moraes e. Diccionario da Lingua Portugueza. 4 ed., Lisboa, Imprensa Régia, 1831. Volume 1.
[xxix] Corpo militar constituído de soldados milicianos que durante o período colonial teve diversas funções, de cunho militar e administrativo.
[xxx] Cifra correspondente ao valor do total dos bens avaliados.
[xxxi] MOURA, Carlos Eugênio Marcondes de (org.) Fazendas de Café do Vale do Paraíba – o que os inventários revelam (1817-1915). Governo do Estado de São Paulo/Secretaria da Cultura, 2014. p. 302 a 304.
[xxxii] Arquivo Público do Estado de São Paulo. Contas de Testamento. Juízo do Resíduo- (BR_APESP_JR_CO05499_DO13).