domingo, 26 de agosto de 2012

Colóquio Preservação de Documentos

Aconteceu no dia 17 passado, no Centro de Documentação e Pesquisa Histórica (CDPH), da Universidade de Taubaté, sob a coordenação de Joaquim Roberto Fagundes, o Colóquio “Preservação de Documentos”, com o objetivo de abrir discussões em torno do assunto para o Vale do Paraíba. Isto por que a região possui um número considerável de instituições culturais com acervos expressivos da cultura material e imaterial, especificamente arquivos contendo fontes escritas e imagéticas. E todos sem o devido aparato técnico e instrumental para a sua guarda, conservação e disseminação.
E durante o evento, tomando como fulcro tal situação, foram levantadas algumas questões fundamentais acerca de identificar, sumariar, salvar e propor soluções teóricas e práticas para essas instituições, cujos documentos têm procedências e assuntos variados. Como também aspectos complexos e multifacetados.
O quesito principal que abriu a discussão foi o resgate e a réplica da informação intrínseca aos fundos documentais como objeto de preservação pouco discutido, analisado e sistematizado. Uma necessidade premente originária de experiências no campo da pesquisa, principalmente pela ausência de instrumentos de pesquisas capazes de responder de imediato as demandas dos cursos de pós-graduação. E da real importância das fontes como instrumento didático para o ensino de disciplinas específicas nos ensino público e particular, em todos os níveis de formação; notadamente na história. Daí a ideia de que a preservação estende-se além da sua proteção física, remetendo também para a criação de métodos e normatizações capazes de recuperar a maior quantidade possível de temas, assuntos, palavras e contextos inseridos em cada corpo documental ou processo individual. Uma conjunção de parâmetros, portanto, que contemple a ação de profissionais de diversas áreas, para a produção de repertórios completos que leve em consideração as características da produção dos documentos brasileiros desde o século XVI. Acrescido do conhecimento prévio das instituições governamentais portuguesas e brasileiras (funcionamento, tipologia dos seus agentes e correlações verticais e horizontais). Com tal perspectiva e consequente aplicação, tal como um laboratório, haveria a possibilidade de elaborar projetos de disseminação e replicagem das informações, ampliando, desse modo, a abrangência do uso documental por todos os níveis da sociedade; seja institucional ou não. A baliza é que o Vale do Paraíba é um extenso celeiro para aplicabilidade de um projeto dessa natureza.
Outro aspecto abordado foi a precariedade dos arquivos na região, presentes notadamente nos museus, aonde a preocupação com fontes escritas não chega a ser o ideal em termos de conservação e objeto de ações concertas. No mínimo a realidade consiste em apenas arranjo e descrição de forma precária (instalações em prédios impróprios, suportes e equipamentos de arquivamento e de trabalho inadequados), ausência de recursos financeiros, técnicos e de mão de obra especializada e cursos técnicos. Falta de apoio governamental, desconhecimento da legislação pertinente ao amparo dos acervos, mecanismos de incentivo cultural e formatação de projetos. Além da completa inexistência de planos arquivísticos contemplando missão, objetivos e instrumentos de ação que possam nortear o trabalho contínuo de instituições dessa natureza.
E ainda neste aspecto, foi suscitada a falta de uma decisiva política de ação educativa em arquivos, o que, entre outras coisas, se existisse, poderia elevaria o nível de consciência de conservação do patrimônio regional por parte da sociedade ou comunidade. Proporcionando também a elaboração de mecanismos e parâmetros complementares das fontes e sua aplicabilidade como instrumento de conhecimento da história, com recursos criativos, didáticos e lúdicos, como a elaboração de cartilhas, jornais e o uso da genealogia, etc.
Também foi relatado sobre uma política para a criação de arquivos municipais, gestão organizacional, administrativa e recolhimento de fontes. Nesse sentido foram evidenciadas as relações profissionais multidisciplinares e a inexistência na grade curricular dos cursos de história de disciplinas pontuais sobre fontes, acervos e arquívistica. Deste modo, o olhar do historiador na criação, gestão e organização dos dados seria fundamental.
Por último, foi evidenciada a necessidade de alguns órgãos culturais independentes, como o Instituto de Estudos Valeparaibanos (IEV) ter participação ativa na gestão e na preservação dos arquivos no Vale do Paraíba.
Em conclusão, o colóquio terminou com a proposta de outros encontros e colóquios sobre o tema, a criação de um grupo no facebook e a discussão sobre um levantamento sistemático de arquivos e fontes na região, com o intento de conhecer e fazer um diagnóstico real.

Imagem: Maurício Patolino (Taubaté-SP).

sábado, 18 de agosto de 2012

Retrocesso com o Patrimônio Documental Paulista

Ontem, eu e um grupo de professores, alunos estagiários e funcionários de arquivos e museus, durante colóquio que coordenei sobre preservação documental no Centro de Documentação e Pesquisa Histórica (UNITAU), falávamos da necessidade urgentíssima de um projeto amplo que possa realizar o levantamento, o resgate, a identificação, a descrição e o diagnóstico dos arquivos e fontes documentais do Vale do Paraíba. Fundamentalmente para salvar, preservar e recuperar documentos e informações deles emanados, para que os tenhamos sistematizado e disponíveis para acesso público, com rapidez e eficiência. E agora está aí uma notícia preocupante, por total falta de planejamento, ação, eficácia e alcance social: a terceirização de acervo judiciário por uma empresa internacional, sem vínculo e comprometimento com a realidade brasileira. E o que é pior sem o olhar, o auxílio e o acompanhamento multidisciplinar de profissionais ligados principalmente com a história paulista. O judiciário está navegando contra as atuais tendências de socializar o conhecimento pelo acesso irrestrito a verdades que dizem respeito a todo povo brasileiro. E nenhum órgão institucional ligado a cultura e ao patrimônio até o momento se colocou contrário para com a atitude do judiciário, o que demonstra o que sempre falamos sobre a política pública de arquivos: ainda está no chão. E no Vale do Paraíba precisamos fazer diferente. Daí a montagem de um grupo regional para cuidar dos nossos acervos documentais com toda a urgência.
Leia a reportagem publicada sobre o assunto, acessando

quinta-feira, 16 de agosto de 2012

Descaso com a Estação Ferroviária de Guaratinguetá

Está em completo abandono parte da primeira estação ferroviária de Guaratinguetá, datada de 1877 e que a Prefeitura Municipal negligenciou em restaurar e revitalizar para o público, como parte de um complexo cultural que no local poderia ser construído. Muita coisa já está perdida e a estrutura está praticamente comprometida; principalmente o telhado, em alguns pontos. Assim como descaracterizada.
Numa cidade onde impera o tradicionalismo convencional e insconciente, parece algo contraditório deixar acontecer algo semelhante. E tal forma tradicionalista e preconceituosa atrasa o desenvolvimento econômico e cultural do município, tendo em consideração o potencial turístico e as oportunidades, daí advindas, para a realização de um número infinito de projetos na área da economia criativa e, consequentemente, de inserção de mão de obra qualificada para tal fim, possibilitando a geração de empregos em áreas alternativas ao setor industrial.
Tal constatação, óbvia por sinal, faz com que façamos aqui uma sugestão: Em vez de distribuir "santinhos" com o seus nomes, números, partidos, dar bom dia, e tomar café com a população, porque os políticos não assinam publicamente, com documento reconhecido em cartório, um termo de comprometimento para cuidar dos bens culturais da nossa cidade (os galpões da estação ferroviária por exemplo). Com certeza vocês estariam colocando em prática a honestidade e retidão de caráter para com a população. Ou será que não existe coragem? Caso seja eleito e não cumpra, poderemos entrar no Ministério Público exigindo o cumprimento do seu dever público. Quem se candidata?

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

As Habilitações Sacerdotais Vita Genere et Moribus

As habilitações de genere destinavam-se à averiguação da legitimidade do requerente e da vivência dos ascendentes segundo os princípios da religião católica, da ocorrência da prática de crimes de lesa magestade, divina ou humana, da incorrência em infâmia pública ou em pena vil. A habilitação de genere era condição para o requerimento da prima tonsura. Os processos corriam perante o ordinário, ou perante o seu provisor e, ou vigário geral, ou perante um desembargador da Relação Eclesiástica como juiz especial (de genere), pelo arcebispo ou pelo cabido sede vacante.
As habilitações de genere são posteriores ao Breve "Dudum charissimi in Christo" do papa Xisto V, de 25 de Janeiro de 1588, que proibia o provimento do benefício em pessoas com ascendência de cristãos novos. Em 1773, passaram a observar as Constituições do bispado da Guarda, pela Lei de 25 de Maio. Em 1779, o provimento do cargo eclesiástico foi alargado aos cristãos novos e a descendentes de turcos, judeus, e gentios, provado o seu bom comportamento, com excepção dos filhos ou netos de pessoa que tivesse cometido crime de lesa magestade divina ou humana, ou regressado ao judaísmo, de acordo com o Breve "Dominus ac Redemptor noster", de Pio VI, datado de 14 de Julho.
Para se iniciar a habilitação de Genere era preciso que o habilitando depositasse na Câmara, a quantia necessária para as despesas das diligências, sendo-lhe passado um recibo, assinado pelo tesoureiro dos depósitos da Câmara, e pelo juiz das justificações de genere, ou pelo escrivão da Câmara. Desde 1842, os recibos eram assinados pelo tesoureiro da Mitra. O recibo fazia parte da instrução do processo e nele constava o número do livro dos depósitos da Câmara e o número do assento correspondente.
O processo de habilitação iniciava-se com a petição do habilitando dirigida ao bispo da sua diocese, onde constava a filiação, a naturalidade dos pais, os nomes e naturalidade dos avós paternos e maternos, destinando-se o processo a justificar estas declarações. Sendo necessário fazer diligências noutra diocese, o juiz das habilitações de genere enviava ao respectivo ordinário, uma precatória ou requisitória de habilitação. Da instrução também faziam parte a comissão da habilitação dirigida ao vigário da vara, se a diligência ocorresse fora da jurisdição do processo, o mandado deste para o pároco da freguesia de naturalidade do habilitando, e de seus ascendentes, a inquirição de testemunhas e certidão das declarações feitas, as certidões de baptismo do habilitando e de seus ascendentes, as certidões de casamento dos pais e avós, podendo ainda constar as declarações dos ofícios dos pais e avós paternos e maternos, as cartas de compatriota, entre outros documentos. A sentença dada em relação, confirmava a informação do habilitando. Se a quantia depositada excedesse as despesas das diligências, o depositante era reembolsado, assinando o recibo que ficava no processo. O juiz das justificações de genere aprovava as contas do processo.
Nos dias atuais ainda é sobretudo utilizada para pesquisa genealógica, como fonte alternativa importante para encontrar os ascendentes de inúmeras famílias de São Paulo. Por constar documentos provando origens e depoimentos de testemunhas ligadas ou não parentalmente ao candidato; determinando residências e descrevendo conduta e vivência dos pais e avós. Incluido, da mesma forma, escrituras de doação de patrimônio material; item exigido para a habilitação, constituido em boa parte por terras e casas.
Para o Vale do Paraíba, os fundos constítuidos por habilitações encontram-se concentrados em três locais específicos: os arquivos das Cúrias Metropolitanas de São Paulo, Rio de Janeiro e Mariana, em Minas Gerais. E se constitui num rico acervo para os estudos nas áreas de História Social, ciências da religião, genealogia, entre outras.
No arquivo da Cúria Metropolitana de São Paulo está depositada a maior parte das habilitações de padres da Ordem do Carmo (quase nada sabe-se sobre ela), que exerceram funções no Vale do Paraíba; datados a partir da segunda metade do século XVIII, com instrumento de pesquisa em ordem alfabética do habilitando.
No Arquivo da Cúria Metropolitana do Rio de Janeiro, embora ainda não organizados completamente, existem habilitações mais antigas, tendo em vista que a referida cúria foi criada bem antes da cúria de São Paulo. Lá encontram-se processo datados do íncio do século XVII, muitos deles de sacerdotes oriundos da região da cidade de São Paulo, cujas famílias posteriormente estabeleceram residência no Vale do Paraíba; muitos deles com biografias desconhecidas. Possui índice informatizado a cargo dos funcionários.
Na cidade de Mariana, encontram-se processos de habilitandos cujas as famílias anteriormente estavam estabelecidos em regiões de São Paulo e datam a partir do século XVIII.
Portanto fundo importantíssimo para conhecer a origem, vida e atuação dos padres no Brasil, principalmente no período colonial e a vida social dos envolvidos nos processos. Bem como outras possibilidades de pesquisa no Vale do Paraíba.
Desenho: representação imagética de uma árvore genealógica na Idade Moderna.